Haruki Murakami é um
escritor japonês que nasceu em 1949, em Kyoto, Japão. É considerado um dos
autores mais importantes da literatura japonesa (mas nem sempre foi assim),
também reconhecido em muitos países. Suas obras foram traduzidas para mais de
40 idiomas.
Recentemente terminei a
leitura de um dos seus livros: Romancista
como Vocação. Nesta obra, Murakami falou muito de sua carreira como
escritor, abordou vários temas e nos falou (com detalhes) como foi o início de
sua profissão (romancista), de forma simples e quase mística aos olhos do
destino.
Haruki Murakami é um tipo
de autor que vai na contramão dos outros autores, está fora do padrão, se assim
podemos dizer. E isso é incrível, pois temos um ponto de vista completamente
diferente do que é ser um escritor (principalmente no Japão, onde Murakami
sofreu terríveis críticas), também ficamos por dentro de seu planejamento
literário, seus compromissos e responsabilidades.
Em alguns pontos me vi
espelhado em Murakami e foi ótimo descobrir que eu tinha práticas em comum com
ele. Sei que (para quem leu o livro, ou conhece a vida do autor) pode parecer
loucura e descompromissado o jeito que Murakami escreve, contudo, funciona.
Está regado de cuidados e estrutura, realmente é uma vida de escritor paralela
a que conhecemos.
Muitos autores gostam de
planejar seus livros (às vezes muito), fazer anotações em vários cadernos,
argumentos, resumos, história pregressa dos personagens etc. Murakami
simplesmente pula essas etapas, senta e escreve o que vêm à cabeça. É claro que
o livro não sai perfeito logo de primeira, são necessárias várias revisões para
modelar o texto de forma geral, por isso, Murakami gosta de escrever sem prazo,
no tempo dele, dessa forma ele consegue se dedicar inteiramente a arte de
escrever, dando o melhor de si, sem correria ou pressão.
Em diversas passagens, o
autor ressalta o quanto ele ama escrever, o quanto esse ato é prazeroso, e no
meio disso tudo ele completa dizendo algo bem curioso: que ele escreve para ele
mesmo. Um comentário que pode parecer um pouco rude, mas ele explica que também
não deixa de pensar no leitor enquanto escreve, mas que não fica preso na
seguinte situação: o autor que escreve para
o leitor, ou, o autor que escreve o que o leitor
quer ler.
Murakami é bem posicionado
nessa questão, se escrever lhe dá prazer, é o que ele ama fazer, então ele vai
escrever o que ele quer, no prazo dele e assim ele se sente bem. E eu lhe
pergunto: “O que há de mal em se sentir
bem?”. Murakami levanta muito essa questão durante o livro, e fui obrigado
a concordar com seus argumentos.
Tenho vontade de comentar
muito mais coisas sobre esse livro maravilhoso que Murakami escreveu, contudo,
o texto ficaria ainda maior, logo, eu gostaria de puxar um assunto que você
pode interpretar como polêmico, mas eu não poderia deixar isso de lado, de
jeito nenhum, principalmente para você que também é escritor.
Murakami começa as
primeiras páginas de seu livro abordando um tema delicado: Os Romancistas. Sim, os próprios escritores. A princípio fiquei um
pouco apreensivo com o que ele poderia falar, mas ao longo da leitura, pude
notar que sua visão sobre muitos escritores é realmente algo relevante a ser
notado. Murakami também parece ter o poder de fazer com que você reflita sobre
assuntos como esses, com os quais concordei, e muito.
Logo de início ele disse
que não podemos considerar os romancistas, pelo
menos não todos, sempre íntegros e imparciais. O que é uma verdade. Em sua
visão, a grande maioria dos escritores é orgulhosos e cheios de si, com
pensamentos que, segundo ele: “o que eu
faço e escrevo está certo, todos os outros escritores estão errados em maior ou
menor grau, exceto alguns casos especiais”. Sobre esse trecho, acredito que
ele realmente esteja certo em ter esse tipo de pensamento, muitos escritores
acabam tendo sua própria opinião, seu próprio livro, sua própria história como
filhos, tornando-se pais superprotetores a ponto de sentirem dificuldades em
aceitarem opiniões alheias sobre sua carreira ou seu trabalho.
Outro ponto interessante
ainda abordado na primeira página de seu livro é quando Murakami diz que de vez
em quando ouve falar que escritores são muito amigos.
Essa afirmação me deixa
com o pé atrás. Não que ele ache impossível uma amizade verdadeira entre
escritores, mas ao que parece, essas amizades não podem ser tão fortes assim,
ou verdadeiras. Isso porque em sua visão, os escritores são basicamente
egoístas, orgulhosos, competitivos e parecem estar sempre em algum tipo de
defensiva com os olhos atentos, esperando um ataque sorrateiro. Mas ele aponta
um ponto de vista mais glorioso da parte dos escritores, os quais estão sempre
de braços abertos para receber aqueles de fora que se aventuram no mundo da
escrita. Murakami diz que o inverso é um pouco mais complicado, por exemplo: se
o escritor fosse se aventurar no mundo da música ou da pintura, seria recebido
com um pouco mais de resistência do que o normal, como se tivesse que realmente
provar o seu valor para ser aceito naquele grupo ou nicho.
Já os escritores não ligam
tanto se um músico ou um pintor resolverem se aventurar em um romance, ele será
bem aceito e inclusive será encorajado a continuar com seu trabalho.
Particularmente eu compartilho dessa opinião, sempre que encontro alguém que
deseja escrever ou que já começou um livro e ainda está em seus primeiros
passos, tento dar uma palavra de motivação ou me coloco à disposição de alguma
maneira, contudo, não posso opinar sobre o outro lado da moeda, pois nunca me
aventurei profissionalmente no mundo da música ou da pintura para ter que me
provar.
Essa amizade entre autores
me leva a pensar em outro contexto que vai em oposição a Murakami. Primeiro eu
gostaria de deixar bem claro que não sei medir essa profundidade de “amizade
verdadeira” ou apenas “alianças”, camaradagem ou coleguismo entre autores, se
assim podemos dizer.
O fato que eu gostaria de
levantar é: que às vezes, essas “panelinhas” tornam-se tão blindadas que é
impossível se envolver no mundo literário profissional. Já pude ver com meus
próprios olhos essas coletâneas autorais, onde centenas e centenas de autores
dão o sangue para elaborar um texto ou roteiro e fazer parte desse trabalho de
coautoria e no fim das contas, são sempre as mesmas pessoas que acabam sendo
escolhidas, e isso acontece com tanta frequência que a tal “panelinha” começa a
ficar em evidência. Então eu me pergunto: “será
que ninguém mais é bom o suficiente para ser escolhido além dessas pessoas,
outra vez?”.
Infelizmente o mundo é
assim, cheio de injustiças que acabam por desmotivar excelentes autores que
estão patinando para se fazer valer no mundo literário. E querendo ou não, o
mercado literário acaba ficando com as portas estreitas para novos talentos que
estão dispostos a saírem do nada, do anonimato.
Bom, sempre têm um rosto
novo aparecendo uma vez ou outra, mas se olharmos bem, veremos que esses novos
rostos podem estar atrelados a essas panelinhas, aquelas velhas e boas
indicações de um amigo que faz parte daquele nicho blindado, e mais uma vez o
coleguismo entra em ação. E agora eu lhe faço outra pergunta: “e o autor que não tem esse privilégio da
indicação amiga? O quanto ele precisa se provar para conseguir o seu lugar de
destaque, de forma justa?”.
Muitas vezes o autor
participa de uma antologia esperando um resultado que pelo menos lhe pareça
justo, contudo, no fim das contas ele acaba se sentindo enganado quando confere
os resultados e percebe que 80% daquelas pessoas já estiveram na antologia
anterior e, além disso, são super entrosados com o organizador nas redes
sociais, quando não, na própria vida social fora da internet. Quando isso
acontece, o coleguismo faz sentido no fim das contas.
Haruki Murakami nunca se
envolveu em “panelinhas” ou nichos blindados, sempre seguiu seu próprio caminho,
seu destino, sem se preocupar com o que os outros pensavam ou diziam, fazia o
seu trabalho, do seu jeito. Recebeu muitas críticas de pessoas que diziam que o
texto dele não era literatura. Que autoridade têm essas pessoas? Uma vez ouvi
que esse tipo de “verdade” é variável, ou seja, até mesmo outro profissional da
área (crítico) pode ter uma opinião diferente, pode até ser que a grande
maioria concorde com essa pessoa, mas sempre terá alguém que vai discordar. Julgar
o texto de alguém e dizer que não é literatura, com certeza é deselegante.
Talvez o melhor mesmo seja
não se envolver em certos grupos tóxicos. Procure se aliar com quem vale a
pena, com alguém que te respeite como semelhante, faça o seu melhor sempre e as
pessoas verão o quanto você é esforçado e justo. Muitas vezes as pessoas não
veem o seu esforço ou o quanto você sofre, pois você está trabalhando em
silêncio, e aos olhos dessas mesmas pessoas, pode parecer que você não está
fazendo nada, o que não é verdade.
Com certeza você se
esforça muito mais do que parece, é justo e não recorre ao oportunismo
descarado. Não é atoa que Murakami diz que a vida profissional de um escritor é
solitária, e mesmo assim, ainda nos deparamos com pessoas que querem tirar a
sua paz.
Por
isso, é indispensável a leitura do livro: Romancista
como vocação.
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